EMENTA: CRIME MILITAR EM SENTIDO IMPRÓPRIO: FALSIFICAÇÃO/USO DE CADERNETA DE INSCRIÇÃO E REGISTRO – CIR, EMITIDA PELA MARINHA DO BRASIL. LICENÇA DE NATUREZA CIVIL. COMPORTAMENTO QUE, EM TESE, AFETA SERVIÇO DA UNIÃO, APTO _A SUBSUMIR-SE À ESFERA DE COMPETÊNCIA PENAL DA JUSTIÇA FEDERAL COMUM (CF, ART. 109, IV). IMPUTAÇÃO PENAL DEDUZIDA, NO CASO, PERANTE A JUSTIÇA MILITAR DA UNIÃO, CONTRA CIVIL. CARÁTER ANÔMALO DA JURISDIÇÃO PENAL MILITAR SOBRE CIVIS, EM TEMPO DE PAZ. _A REGULAÇÃO DO TEMA PERTINENTE À JUSTIÇA MILITAR NO PLANO DO DIREITO COMPARADO. TENDÊNCIA QUE SE REGISTRA, MODERNAMENTE, EM SISTEMAS NORMATIVOS ESTRANGEIROS, NO SENTIDO DA EXTINÇÃO (PURA E SIMPLES) DE TRIBUNAIS MILITARES EM TEMPO DE PAZ OU, ENTÃO, DA EXCLUSÃO DE CIVIS DA JURISDIÇÃO PENAL MILITAR: PORTUGAL (CONSTITUIÇÃO DE 1976, ART. 213, QUARTA REVISÃO CONSTITUCIONAL DE 1997), ARGENTINA (LEY FEDERAL Nº 26.394/2008), COLÔMBIA (CONSTITUIÇÃO DE 1991, ART. 213), PARAGUAI (CONSTITUIÇÃO DE 1992, ART. 174), MÉXICO (CONSTITUIÇÃO DE 1917, ART. 13) e URUGUAI (CONSTITUIÇÃO DE 1967, ART. 253, c/c LEY 18.650/2010, ARTS. 27 E 28), v.g.. UMA RELEVANTE SENTENÇA DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS (“CASO PALAMARA IRIBARNE VS. CHILE”, DE 2005): DETERMINAÇÃO PARA QUE A REPÚBLICA DO CHILE, ADEQUANDO A SUA LEGISLAÇÃO INTERNA AOS PADRÕES INTERNACIONAIS SOBRE JURISDIÇÃO PENAL MILITAR, ADOTE MEDIDAS COM O OBJETIVO DE IMPEDIR, QUAISQUER QUE SEJAM AS CIRCUNSTÂNCIAS, QUE “um civil seja submetido à jurisdição dos tribunais penais militares (...)” (item nº 269, n. 14, da parte dispositiva, “Puntos Resolutivos”). O CASO “EX PARTE MILLIGAN” (1866): IMPORTANTE “LANDMARK RULING” DA SUPREMA CORTE DOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. DECISÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL MILITAR QUE SE PÕE EM CONFLITO COM O POSTULADO DO JUIZ NATURAL. O ALTO SIGNIFICADO E O ALCANCE DESSE PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL. A POSSIBILIDADE DE SUA ANÁLISE SOB DUPLA PERSPECTIVA: “ex parte subjecti” e “ex parte principis”. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA.
DECISÃO: A presente impetração insurge-se contra decisão, que, emanada do E. Superior Tribunal Militar, encontra-se consubstanciada em acórdão assim ementado:
“‘HABEAS CORPUS’. USO DE DOCUMENTO FALSO. CADERNETA DE INSCRIÇÃO E REGISTRO - CIR. SERVIÇO DE POLÍCIA MARÍTIMA.COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA MILITAR.
Civis acusados de utilizar documento não autêntico, cuja expedição do original incumbe à Capitania dos Portos e demais órgãos que integram a estrutura organizacional da Marinha do Brasil.
Revestida de fé pública, eventual adulteração nos dados originais de Caderneta de Inscrição e Registro repercute negativamente na credibilidade das instituições militares e atenta contra a ordem administrativa militar, do que decorre a configuração do crime de natureza militar.
Competência da Justiça Militar da União.
Ordem denegada.
Decisão unânime.” (grifei)
As razões constantes da presente impetração parecem justificar – ao menos em juízo de estrita delibação – a densa plausibilidade jurídica da pretensão deduzida nesta sede processual, especialmente se se considerar julgamento, por mim proferido na colenda Segunda Turma, em que este Tribunal, examinando a suposta prática, por civil, em tempo de paz, de crime militar, reconheceu não configurado o delito castrense em acórdão que possui a seguinte ementa:
“‘HABEAS CORPUS’ - CRIME DE LESÕES CORPORAIS CULPOSAS CONTRA MILITAR EM MANOBRA - INOCORRÊNCIA DE CRIME MILITAR - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM - POSTULADO DO JUIZ NATURAL – (...) - PEDIDO DEFERIDO.
EXCEPCIONALIDADE DA COMPETÊNCIA PENAL DA JUSTIÇA MILITAR DA UNIÃO, EM TEMPO DE PAZ, TRATANDO-SE DE RÉU CIVIL.
- Não se tem por configurada a competência penal da Justiça Militar da União, em tempo de paz, tratando-se de réus civis, se a ação delituosa, a eles atribuída, não afetar, ainda que potencialmente, a integridade, a dignidade, o funcionamento e a respeitabilidade das instituições militares, que constituem, em essência, nos delitos castrenses, os bens jurídicos penalmente tutelados.
- O caráter anômalo da jurisdição penal castrense sobre civis, notadamente em tempo de paz. _O caso ‘Ex Parte Milligan’ (1866): um precedente histórico valioso.
O POSTULADO DO JUIZ NATURAL REPRESENTA GARANTIA CONSTITUCIONAL INDISPONÍVEL, ASSEGURADA _A QUALQUER RÉU, EM SEDE DE PERSECUÇÃO PENAL, MESMO QUANDO INSTAURADA PERANTE A JUSTIÇA MILITAR DA UNIÃO.
- O princípio da naturalidade do juízo representa uma das mais importantes matrizes político-ideológicas que conformam a própria atividade legislativa do Estado e condicionam o desempenho, pelo Poder Público, das funçõesde caráter penal-persecutório,notadamente quando exercidas em sede judicial.
_O postulado do juiz natural, em sua projeção político-jurídica, reveste-se de dupla função instrumental, pois, enquanto garantia indisponível, tem, por titular, qualquer pessoa exposta, em juízo criminal, à ação persecutória do Estado, e, enquanto limitação insuperável, representa fator de restrição que incide sobre os órgãos do poder estatal incumbidos de promover, judicialmente, a repressão criminal.
- _É irrecusável, em nosso sistema de direito constitucional positivo - considerado o princípio do juiz natural - que ninguém poderá ser privado de sua liberdade senão mediante julgamento pela autoridade judiciária competente. Nenhuma pessoa, em conseqüência, poderá ser subtraída ao seu juiz natural. A nova Constituição do Brasil, ao proclamar as liberdades públicas - que representam limitações expressivas aos poderes do Estado - consagrou, de modo explícito, o postulado fundamental do juiz natural. O art. 5º, LIII, da Carta Política prescreve que ‘ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente’. (...).”
(HC 81.963/RS, Rel. Min. CELSO DE MELLO)
DECISÃO: A presente impetração insurge-se contra decisão, que, emanada do E. Superior Tribunal Militar, encontra-se consubstanciada em acórdão assim ementado:
“‘HABEAS CORPUS’. USO DE DOCUMENTO FALSO. CADERNETA DE INSCRIÇÃO E REGISTRO - CIR. SERVIÇO DE POLÍCIA MARÍTIMA.COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA MILITAR.
Civis acusados de utilizar documento não autêntico, cuja expedição do original incumbe à Capitania dos Portos e demais órgãos que integram a estrutura organizacional da Marinha do Brasil.
Revestida de fé pública, eventual adulteração nos dados originais de Caderneta de Inscrição e Registro repercute negativamente na credibilidade das instituições militares e atenta contra a ordem administrativa militar, do que decorre a configuração do crime de natureza militar.
Competência da Justiça Militar da União.
Ordem denegada.
Decisão unânime.” (grifei)
As razões constantes da presente impetração parecem justificar – ao menos em juízo de estrita delibação – a densa plausibilidade jurídica da pretensão deduzida nesta sede processual, especialmente se se considerar julgamento, por mim proferido na colenda Segunda Turma, em que este Tribunal, examinando a suposta prática, por civil, em tempo de paz, de crime militar, reconheceu não configurado o delito castrense em acórdão que possui a seguinte ementa:
“‘HABEAS CORPUS’ - CRIME DE LESÕES CORPORAIS CULPOSAS CONTRA MILITAR EM MANOBRA - INOCORRÊNCIA DE CRIME MILITAR - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM - POSTULADO DO JUIZ NATURAL – (...) - PEDIDO DEFERIDO.
EXCEPCIONALIDADE DA COMPETÊNCIA PENAL DA JUSTIÇA MILITAR DA UNIÃO, EM TEMPO DE PAZ, TRATANDO-SE DE RÉU CIVIL.
- Não se tem por configurada a competência penal da Justiça Militar da União, em tempo de paz, tratando-se de réus civis, se a ação delituosa, a eles atribuída, não afetar, ainda que potencialmente, a integridade, a dignidade, o funcionamento e a respeitabilidade das instituições militares, que constituem, em essência, nos delitos castrenses, os bens jurídicos penalmente tutelados.
- O caráter anômalo da jurisdição penal castrense sobre civis, notadamente em tempo de paz. _O caso ‘Ex Parte Milligan’ (1866): um precedente histórico valioso.
O POSTULADO DO JUIZ NATURAL REPRESENTA GARANTIA CONSTITUCIONAL INDISPONÍVEL, ASSEGURADA _A QUALQUER RÉU, EM SEDE DE PERSECUÇÃO PENAL, MESMO QUANDO INSTAURADA PERANTE A JUSTIÇA MILITAR DA UNIÃO.
- O princípio da naturalidade do juízo representa uma das mais importantes matrizes político-ideológicas que conformam a própria atividade legislativa do Estado e condicionam o desempenho, pelo Poder Público, das funçõesde caráter penal-persecutório,notadamente quando exercidas em sede judicial.
_O postulado do juiz natural, em sua projeção político-jurídica, reveste-se de dupla função instrumental, pois, enquanto garantia indisponível, tem, por titular, qualquer pessoa exposta, em juízo criminal, à ação persecutória do Estado, e, enquanto limitação insuperável, representa fator de restrição que incide sobre os órgãos do poder estatal incumbidos de promover, judicialmente, a repressão criminal.
- _É irrecusável, em nosso sistema de direito constitucional positivo - considerado o princípio do juiz natural - que ninguém poderá ser privado de sua liberdade senão mediante julgamento pela autoridade judiciária competente. Nenhuma pessoa, em conseqüência, poderá ser subtraída ao seu juiz natural. A nova Constituição do Brasil, ao proclamar as liberdades públicas - que representam limitações expressivas aos poderes do Estado - consagrou, de modo explícito, o postulado fundamental do juiz natural. O art. 5º, LIII, da Carta Política prescreve que ‘ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente’. (...).”
(HC 81.963/RS, Rel. Min. CELSO DE MELLO)